COMO VENCER A DEPRESSÃO: UMA ANÁLISE DO SALMO 42
Pr Luciano R. Peterlevitz
Introdução
Alguns acham que depressão é “frescura”, “coisa de gente desocupada”. Outros acham que é sinal de falta de fé ou sinônimo de carnalidade: “crente que é crente não tem depressão”; “se tem depressão é porque está em pecado”. Lamentavelmente a pessoa depressiva é alvo de comentários preconceitos. Os amigos de Jó estão por aí.
A depressão é uma doença psiquiátrica que produz sentimentos de tristeza, desânimo, desesperança, desencanto, e pode levar a pessoa ao suicídio. Kátia Regina GoebelNichele, psicóloga cristã, compara essa doença da alma com a experiência de passar por um túnel escuro e longo.[1]
O Salmo 42 foi escrito por alguém que estava com alma abatida e perturbada (v.5,11). Passava pelo túnel sombrio da depressão.
Salmo 42: Considerações preliminares
Os Salmos 42 e 43 estão interligados. Em vários manuscritos hebraicos eles compõem um único poema. Esses dois Salmos pertencem ao conjunto dos Salmos “dos filhos de Corá (Salmos 42 – 49). De todos os Salmos dos filhos de Corá, somente o Salmo 43 não recebe o cabeçalho (título sobre o Salmo), isso porque este Salmo 43 é uma continuação do Salmo 42.
Além disto, os Salmos 42 e 43 possuem um mesmo estribilho (42.5, 11; 43.5), que evidência ainda mais o elo entre esses dois poemas.
Portanto, quem lê o Salmo 42, não pode perder de vista o Salmo 43.
Quero destacar duas informações do cabeçalho do Salmo 42:
- “Salmo didático” (hebr. maskil): um salmo escrito com objetivo didático. O salmista quer nos ensinar a superar o abatimento da alma.
Passar pelo túnel escuro da depressão é angustiante e tenebroso, mas é confortante saber que outros, antes de nós, já trilharam por esse caminho sombrio, e, com a graça de Deus, conseguiram alcançar a luz no final do túnel.
- “filhos de Corá”. Eram levitas responsáveis pelo ministério da música no templo de Jerusalém (2Cr 20.19). O levita que escreveu o Salmo 42 era alguém envolvido no ministério do Templo de Jerusalém. Apesar de compromisso com a obra de Deus, e passar de sua comunhão com Deus e com outros irmãos, passou pelo túnel escuro da depressão.
O comunhão com Deus não nos isenta da depressão. os crentes, por mais santos e consagrados que sejam, ainda que sejam atuantes na igreja, estão sujeitos ao abatimento da alma. O ousado profeta Elias enfrentou a caverna da depressão, a ponto de desejar a própria morte (1Rs 19.4). Davi, homem segundo o coração de Deus, esmagado pela culpa, experimentou grande aflição de alma e seu coração gemia (Sl 38.8). O profeta Jonas deixou o ódio e a amargura tomarem conta do seu coração, e o clamor suicida esteve em seus lábios (Jn 4.3). Paulo, o homem que foi arrebatado ao terceiro céu, passou por momentos de profundos abatimentos a ponto de se desesperar da própria vida (2Co 1.8). O próprio Jesus, o Homem Perfeito, soou gotas de sangue, e orou com grande agonia na alma (Lc 22.44). Jesus não era pecador, e mantinha constante comunhão com o Pai, e mesmo assim sofreu terrível angústia. Conclusão: se entramos em uma depressão isso não significa necessariamente que estamos afastados de Deus. Depressão não é sinônimo de incredulidade ou carnalidade.
“Somos todos feitos de carne e osso. Eis a razão pela qual não somente Davi, mas muitos homens de fé, mesmo tendo sido grandes instrumentos de Deus, viveram momentos de grande angústia e sofrimento, reagindo de modo que jamais imaginamos.” (Kátia Regina GoebelNichele).
A circunstância do Salmo 42
O autor dos Salmos 42 e 43 estava “no monte Hermon” (42.6), na nascente do rio Jordão, ao norte da terra de Israel. Kidner explica: “É o lamento de um cantor do Templo exilado no norte, perto do nascente do Jordão, que anseia por estar de volta na casa de Deus, e que transforma seus anseios em fé resoluta e esperança do próprio Deus.”[2]
Os sinais da depressão
O salmista demonstra alguns sintoma da depressão:
O choro contínuo (v.3)
“As minhas lágrimas têm sido o meu alimento dia e noite’. Ao parece, o salmista perdeu o apetite. Não se alimentava mais. O seu único alimento eram suas lágrimas.
Aquele levita chorava dia e noite. Absorveu as palavras ofensivas dos seus interlocutores. Estes continuamente perguntavam para aquele sofredor: “O teu Deus, onde está?” (v.3,10).
Nostalgia (v.4)
O filho de Corá se lembra dos momentos festivos, quando estava entre a “multidão do povo” / “multidão em festa”. Três vezes por ano os israelitas peregrinavam para o Templo de Jerusalém, para comemorarem as três grandes festas anuais: páscoa, pentecostes e tabernáculos (Êx 23.14-17). Para aquele levita, as peregrinações alegres eram coisas do passado.
Alma abatida e perturbada: (v.5,6,11)
“Por que estás abatida, ó minha alma?”. O verbo “estar abatido” tem o sentido geral de “estar curvado”. Nesses versos 5,6 e 11 significa “estar derrubado, desesperado”. O salmista descreve a desintegração da sua alma, a dissolução do seu poder vital interior.[3]Ele estava totalmente sem ânimo, sem força para continuar a vida. “Por que te perturbas dentro de mim?” poderia ser traduzido como “Porque gemes dentro de mim?”. A alma daquele levita está perturbada, inquieta, angustiada. Dentro dele só havia gemidos de dor.
Sensação de afogamento (v.7)
“Abismo chama abismo ao rugir das tuas cachoeiras; todas as tuas ondas e vagalhões se abateram sobre mim” (NVI). As ondas de Javé afogavam aquele sofredor. Ele tinha a sensação de estar se afogando (cf. Sl 88.17). Sentia falta de ar, um sintoma comum de quem experimenta crises de ansiedade.
Dores físicas (v.10)
“Esmigalham-se-me os ossos”. O salmista descreve o “despedaçamento” (hebr. beretsah) dos seus ossos, uma referência às suas dores físicas (Sl 38.3). A palavra utilizada aqui (beretsah) refere-se ao assassinato (Ez 21.22[27]). Tratar-se-iade uma ferida mortal,[4] causada pelos insultos dos blasfemadores que dirigiam palavras ofensivas para o levita depressivo. As palavras hostis daqueles críticos entraram em sua mente, assediaram o seu coração e adoeceram a sua alma. Resultado: o seu corpo adoeceu. Quando a alma adoece, o corpo padece. As aflições da alma resultam em dores físicas: dor de estômago, dor de cabeça, dores nas costas, no ombros e na nuca.
A cura para alma abatida
O Salmo 42 não é somente o lamento de uma pessoa depressiva. É, também, o canto daquele que busca o auxílio do Senhor. É a expectativa de alguém que tem fé em Deus. O sofredor perdeu a alegria, mas não perdeu a esperança. Ele não somente apresenta o túnel escuro da depressão, mas também indica o caminho para sair desse túnel.
Como vencer a depressão?
1. Tenha sede de Deus: v.1-2
V.1: A corça é um animal que consegue farejar as correntes de água. Nos lugares secos, ela suspira pelas águas. Do mesmo modo, o salmista deseja o Senhor.
V.2: “A minha alma tem sede de Deus, do Deus vivo; quando irei e me verei perante a face de Deus?”. Ao se referir a Deus como o “Deus vivo”, provavelmente o salmista apresenta a imagem de Deus como a “água viva” (Jr 2.13; 17.13).[5]A sede da corça é saciada pelas correntes de águas. Do mesmo modo, a sede espiritual do salmista só será saciada pelos rios das águas vivas que brotam do trono de Deus.
As águas das poças lamacentas não matam a sede. Precisamos das correntes de águas. Quando passam pelo deserto da depressão, muitos tentam matar a sede da alma com soluções paliativas: comida, bebida, drogas, consumismo, pornografia, entretenimento (Netflix, redes sociais etc.). Outros optam pelo mais trágico: o suicídio. Outros querem saciar a sede da alma se entregando ao trabalhando excessivo, achando que, ocupando a mente, poderão satisfazer o suspiro da alma. Outros, ainda, se dopam de medicação.
Jr 2.13: “Porque dois males cometeu o meu povo: a mim me deixaram, o manancial de águas vivas, e cavaram cisternas, cisternas rotas, que não retêm as águas”.
Jesus disse: “aquele que crer em mim do seu interior fluirão rios de águas vivas” (Jo 7.38).
No final do v.2, o sofredor expressa o seu maior desejo: “quando irei e me verei perante a face de Deus?”. No Antigo Testamento, ir “perante a face de Deus” ou “ver a face de Deus” significava comparecer diante de Deus no santuário (Êx 23.17; Sl 84.7).
John Piper observa algo muito importante sobre o desejo do salmista aqui no Salmo 42.1-2: “O que torna isto tão lindo, tão crucial para nós, é que a coisa principal que o deixa sedento não é o alívio de suas circunstâncias ameaçadoras. Ele não está sedento principalmente por escapar de seus inimigos ou pela destruição deles.”[6]
Piper explica: “Não é errado querer alívio e orar por isso. Às vezes é correto orar pela derrota dos inimigos. Porém mais importante do que qualquer um destes motivos é Deus por Si próprio”.
Qual o nosso maior desejo: o alívio da dor ou a presença de Deus? Talvez não temos conseguido aquilo que mais queremos porque não temos desejado aquilo que mais precisamos.
2. Admita o problema: v.5,6
O salmista confessa que estava abatido e desesperado. “Por que estás abatida, ó minha alma? Por que te perturbas dentro de mim?” (42.5,1; 43.5). Ele estava arrebentado por dentro.
Diante de uma situação de aflição, muitas vezes queremos convencer a nós mesmos e aos outros que estamos bem, quando, na verdade, estamos com a alma prostrada. Muitos não querem admitir que estão passando pelo túnel escuro da depressão.
Responda sinceramente: Você está bem mesmo?
3. Não desista de lutar
O levita que escreveu o Salmo 42 estava lutando por esperança. “Ele não está se rendendo às emoções de desânimo. Ele está contra-atacando.” (John Piper).
O Senhor “espera de nós uma resposta racional, uma cooperação que reflita os recursos com que nos dotou. A nossa dependência de Deus não nos isenta de cumprirmos a nossa parte.” (Kátia Regina GoebelNichele).
- Um velejador sabe que depende do vento para levar o seu barco ao lugar desejado. Mas ele precisa içar as velas, expondo-as à pressão do vento. Ele precisa posicionar as velas contra ou a favor do vento, para seu que seu barco movimente-se na direção almejada.
- Para que nossa vida não naufrague no oceano da depressão, precisamos que o Senhor sopre em nós o seu fôlego de vida. Mas nós precisamos içar as velas. Precisamos voltar nossos pensamentos para Sua Palavra. Precisamos nos levantar para lutar contra o desânimo.
4. Pregue para sua alma: v.5,11
Nos v.5 e 11, o salmista fala consigo mesmo.
Martin Lloyd-Jones propõe a seguinte explicação para esses versos:
Estou dizendo que o maior problema em toda essa questão de depressão espiritual, num sentido, é que permitimos que o nosso “eu ” fale conosco, em vez de nós falarmos com o nosso “eu”… Já perceberam que uma grande parte da infelicidade e perturbação em suas vidas provém do fato, que estão escutando a si mesmos em vez de falar consigo mesmos?
Por exemplo, considerem os pensamentos que lhes vêm à mente quando acordam de manhã. Vocês não os originaram mas esses pensamentos começam a “falar” com vocês, trazendo de volta os problemas de ontem, etc. Alguém está falando. Quem está lhes falando? O seu “eu” está falando com vocês. Ora, o que o salmista fez foi o seguinte: em vez de permitir que esse “eu” falasse com ele, ele começou a falar consigo mesmo. “Por que estás abatida, ó minha alma?” ele pergunta. Sua alma estava deprimida, esmagando-o. Por isso ele se dirige a ela, dizendo: “Ouça por um momento, eu quero falar contigo”.[7]
Precisamos aprender a ter controle sobre nós mesmos. Como? Falando conosco mesmo. “Tendo feito isso”, diz Lloyd-Jones, “termine com esta nota de triunfo: desafiea si mesmo, desafie os outros, desafie o diabo e o mundo todo, dizendo com este homem, ‘Eu ainda o louvarei. Eleé a salvação da minha face[8], e o meu Deus”.[9]
Preciso dizer constantemente para mim mesmo:
“Espera em Deus, Luciano. Espera em Deus. Você irá louvá-lo novamente. Esse sentimento de tristeza vai passar. Esse tempo de angústia vai chegar ao fim. Não fique abatido. Hoje minha alma está curvada, mas amanhã ela estará restaurada. Olhe para Jesus. A luz irá nascer. Um novo vai amanhecer.”
Se for necessário, coloque uma placa bem grande em algum lugar bem visível da sua casa: “Espere em Deus”.
5. Reafirme a esperança em Deus: v.5, 11
Quando pregamos para nós mesmos, reafirmamos a nossa esperança em Deus.
Como já falamos, a depressão pode ser comparada com a experiência de passar por um túnel escuro. O túnel poder ser longo e sombrio. “Mas sabemos também que os túneis sempre têm uma saída. Os túneis nunca são um fim em si mesmos. Eles existem para transpor obstáculos. Não existem situações difíceis o bastante para as quais Deus não possa suprir uma saída.” (Kátia Regina GoebelNichele).
“Espera em Deus, pois ainda o louvarei, a ele, meu auxílio e Deus meu” (42.5b[10]; 11b; 43.5).
No final desses versos, o hebraico diz: “eu ainda o louvarei, ele é a salvação da minha face e Deus meu”. O homem de alma abatida afirma que sua “face” seria restaurada pelo Deus Salvador. A “face” expressa o que está no coração (Gn 4.5,6; Pv 15.13). Ao afirmar que Deus é a “salvação” da sua “face”, o salmista está dizendo que o Deus Salvador iria restaurar sua saúde emocional.
Como está a sua face? O seu rosto está decaído? Talvez no face[facebook]a sua face esteja bonita. Mas em casa, quando você está sozinho, como fica a sua face? A sua face do face é mesma de sua casa? Lembre-se: Deus é o salvador das faces! Quando Ele infunde em nós sua alegria indizível, nossa aparência é transformada.
6. Lembre-se de Deus no presente para ter um futuro melhor: v.6
Quando se lembrava do passado, o coração do salmista se enchia de tristeza (v.4). Ele trazia à memória aqueles momentos que celebrava ao Senhor no meio da multidão do povo de Deus. Contudo, ele conseguiu superar a nostalgia. Não se tornou prisioneiro do passado. Declara a certeza de que um dia voltaria a louvar ao Senhor com a multidão dos fiéis: “Então, irei ao altar de Deus, de Deus, que é a minha grande alegria; ao som da harpa eu te louvarei, ó Deus, Deus meu” (Sl 43.4).
Muitas pessoas estão presas ao passado. Desejam regressar aos momentos felizes do passado. O passado é idealizado e supervalorizado. “Naquela época, tudo era bem melhor: as igrejas eram melhores, os pastores eram melhores, os jovens eram mais puros, os políticos não roubavam, tinha menos ladrão, etc.”. Aqueles que romantizam o passado não agem de forma sábia, conforme ensina o Pregador no livro emEc 7.10: “Jamais digas: Por que foram os dias passados melhores do que estes? Pois não é sábio perguntar assim”.
A nostalgia do passado pode levar à depressão, principalmente quando relacionada à saudades de pessoas queridas que faleceram. Muitos querem de volta o cônjuge que partiu ou o filho que se foi.
Você não pode mudar o passado. Mas pode mudar o futuro. Como isso é possível? Para responder essa questão, precisamos levantar outra pergunta: como o salmista venceu a melancolia em relação ao passado? Olhemos para 42.6:
“Sinto abatida dentro de mim a minha alma; lembro-me, portanto, de ti, nas terras do Jordão…”.
O salmista se lembra dos feitos poderosos de Deus no passado. Quando os israelitas se lembravam as maravilhas que Deus realizou no passado, eles estavam afirmando que, do mesmo como Deus agiu na história passada, Ele iria agir na história presente. Por isso, o Salmo 105.5 faz a seguinte convocação: “Lembrai-vos das maravilhas que fez, dos seus prodígios e dos juízos de seus lábios”.
Portanto, precisamos nos lembrar do passado, mas não para ficarmos presos a ele com pensamentos melancólicos, mas sim para nos recordarmos das maravilhas que Deus fez e afirmarmos que, assim como interviu no passado, Deus intervirá com graça em nosso presente. O nosso problema é que nos esquecemos rapidamente das maravilhas que Ele fez.
Tememos o mal do futuro porque nos esquecemos das coisas boas que Deus nos fez no passado.
É importante também considerarmos o sentido do verbo “lembrar” (hebr. zakar), aqui no Salmo 42.6. Não é só um recordar (não é meramente trazer à mente pensamentos sobre Deus). Este verbo hebraico, zakar, tem o sentido de “fazer menção, mencionar, recitar”. No Antigo Testamento, zakarocorre junto com outros verbos que expressam o “meditar, falar em voz baixa” (Sl 63.6; 77.3. cf. Jr 20.9).
Jn 2.7: “Quando, dentro de mim, desfalecia a minha alma, eu me lembrei do SENHOR; e subiu a ti a minha oração, no teu santo templo”. Quando Jonas diz que se lembrou do Senhor, ele está dizendo quefez uma oração audível.
Os antigos hebreus se lembravam das maravilhas do Senhor recitando os hinos que declaram os feitos poderosos de Deus na história de Israel (cf. 1Cr 16.7,8,12). Alguns exemplos de hinos / récitas que anunciam as grandes obras de Deus são os Salmos 104, 105 e 106.
Portanto, quando o salmista afirma “lembro-me de ti”, não significa que sua mente divagava sobre Deus. É muito mais do que isso. Aquele levita sofredor recitava salmos. Ele meditava nos Salmos, na Palavra de Deus. Orava. Por isso, no final do v.8 ele afirma que, durante à noite, ele entoava um “cântico” e dirigia sua “oração” ao Deus da sua vida. No meio da noite, ele entoava louvores a Deus, cantava os salmos, narrando assim as maravilhas de Deus (cf. Sl105.2,5). “Esta não é uma canção de esperança jubilante. Ele não sente uma esperança jubilante. Ele está buscando uma esperança jubilante.” (John Piper).
É isso que precisamos fazer nos momentos de abatimento: pensar em Deus, não meramente olhando para as nuvens ou para as flores, mas principalmente olhando para Sua Palavra, repetindo as palavras da Sua Palavra, memorizando as Escrituras, falando em voz alta versos da Bíblia, trazendo à memória aquilo que nos dá esperança (Lm 3.21) e dirigindo nossas vozes a Deus em oração. O que nos levanta do abatimento não são os nossos pensamentos sobre Deus, mas sim os pensamentos de Deus sobre nós. Por isso precisamos trazer os pensamentos de Deus aos nossos pensamentos.
Cada pensamento de tristeza precisa ser seguido por dez pensamentos sobre a graça e o amor de Deus. Pare e pense: quantas vezes no dia você pensa em coisas ruins e quantas vezes no dia você pensa na bondade de Deus revelada na Sua Palavra? Se durante o dia você trazer à mente mil pensamentos sobre a Palavra de Deus e só alguns poucos pensamentos melancólicos, então você estará trilhando o caminho da cura da alma.
7. Reafirme a soberania de Deus: v.7
“Abismo chama abismo ao rugir das tuas cachoeiras; todas as tuas ondas e vagalhões se abateram sobre mim” (NVI).
As palavras daquele sofredor podem parecer agressivas. Ele está dizendo: “Deus, o Senhor enviou um mar de águas contra mim; a dor que eu sinto foi enviada por Ti”.
O mar agitado que derrubou o salmista não vinha do diabo, dos homens injustos ou do acaso. Vinha de Deus.
O sofredor do Salmo 88 também reconhece que sua aflição vinha do Todo-Poderoso:
6 Puseste-me na mais profunda cova, nos lugares tenebrosos, nos abismos. 7 Sobre mim pesa a tua ira; tu me abates com todas as tuas ondas. 8 Apartaste de mim os meus conhecidos… (Sl 88.6-8).
O apóstolo Paulo, quando fala do seu “espinho na carne”, reconhece que sua dor vinha de Deus “E, para que não me ensoberbecesse com a grandeza das revelações, foi-me posto(passivo divino) um espinho na carne, mensageiro de Satanás, para me esbofetear, a fim de que não me exalte” (2Co 12:7).
A soberania de Deus é a derradeira esperança do sofredor. Se foi Deus quem enviou as ondas para afogar a minha alma, então é Ele, e somente Ele, pode salvar do afogamento.
8. Reconheça a graça de Deus: v.8
O Deus que envia as ondas (v.7) é o Deus que envia o seu amor (v.8). Se olhamos somente para soberania de Deus sem o seu amor, entramos em crise.
Não há nada mais confortante para o abatido do que o graça soberana de Deus.
Charles Spurgeon, o príncipe dos pregadores, que lutou toda a vida contra a depressão, declarava: “Temo que toda a graça que eu recebi, dos momentos fáceis e confortáveis, e também das horas alegres que passei, caberia toda ela sobre uma moeda de um centavo. Mas o bem que eu tenho recebido de minhas tristezas, dores, e dissabores é totalmente incalculável… A aflição é a melhor mobília de minha casa. É o melhor livro da biblioteca de um pastor [ou cristão].
9. Faça oração ao Deus da sua vida: v.8
Lá estava aquele sofredor, no meio das trevas, entoando louvores ao Senhor, e orando ao Deus da sua vida.
Ele não somente entoava hinos e ações de graças. Ele também desabafava com Deus. O v.9 revela o que ele orava: “Digo a Deus, minha rocha: por que te esqueceste de mim? Por que hei de andar eu lamentando sob a opressão dos meus inimigos?”.
Parece uma pergunta imprópria, não acha?
Mas o salmista está falando com a Pessoa certa.
Não despeje sua ira nas outras pessoas. Não desabafe nas redes sociais. Desabafe com Deus.
A sensação do salmista era que ele havia sido abandonado por Deus: “por que te esqueceste de mim?”. É uma pergunta exagerada. Mas é uma pergunta legítima.
Melhor expressar uma dúvida sincera do que expressar uma certeza insincera.
Apesar de questionar a Deus, o sofredor reconhece Deus como sua rocha: “Digo a Deus, minha rocha” (v.9). Mesmo que Deus derrama sua enxurrada sobre nós (v.7), Ele sempre será nossa rocha. Em meios as correntezas, podemos nos apegar à Pedra firme. Em meio as redemoinhos avassaladores, podemos correr ao abrigo do Deus Todo Poderoso.
Conclusão
O salmista depressivo ansiava ver a face de Deus. “Quando irei verei a face de Deus?”, perguntava o sofredor (Sl 42.2).
Como podemos ver a face de Deus? A resposta está em Jesus. Nele, em Cristo, vemos a face de Deus. Jesus disse: “Quem me vê, vê o Pai!” (Jo 14.9).
O crente depressivo do Salmo 42 desejava que Deus lhe enviasse a luz que o conduziria aos tabernáculos do Senhor, ao monte santo da presença de Deus (Sl 43.3). Cristo é a resposta para este desejo. Cristo é a luz que nos leva à presença de Deus. Quando nos convertemos, vemos “a luz do evangelho da glória de Cristo, que é a imagem de Deus” (2Co 4.4).
Você está passando pelo túnel escuro da depressão? Que a luz de Cristo brilhe poderosamente em sua vida. Jesus Cristo é a única esperança.
[1]Kátia Regina GoebelNichele, “Sombras no caminho”. Disponível em: https://www.isaltino.com.br/2010/04/sombras-no-caminho/. Acessadoem 19.08.2020.
[2] Derek Kidner, Salmos 1-72, p. 185.
[3]Hans Joachim Kraus, Psalms 1-59: a commentary (Minneapolis: Augsburg, 1988), p. 440.
[4] Hans Joachim Kraus, Psalms 1-59: a commentary (Minneapolis: Augsburg, 1988), p. 440.
[5] Allan M. Harman, Salmos (São Paulo: Cultura Cristã, 2011), p. 193.
[6] John Piper, “Depressão Espiritual nos Salmos”. Disponível em https://www.desiringgod.org/messages/spiritual-depression-in-the-psalms?lang=pt. Acessado em 19.08.2020.
[7] D. M. Martin Lloyd-Jones, Depressão espiritual, 1. ed. (PES/Publicações Evangélicas Selecionadas: 1987), p. 7.
[8] No final do verso, o hebraico diz literalmente: “eu ainda o louvarei, a salvação da minha face”.
[9] D. M. Martin Lloyd-Jones, Depressão espiritual, p. 7.
[10] No texto hebraico, a palavra ’elohay, “Deus meu” está no início do v.6[7], devendo, contudo, ser transposto para o fim do v.5[6].