Os ÍMPIOS
Pr Luciano R. Peterlevitz – Igreja Batista Bela Vista, 18.08.2019
TEXTO: Salmo 1.4-5
Introdução
Conforme já averiguamos, os v.1-3 do Salmo 1 apresenta o homem bem aventurado. O seu perfil é completamente distinto do ímpio (v.1). Na verdade, o seu maior deleite é a instrução de Javé, e nela ele medita constantemente (v.2). A fonte de sua vida é o próprio Javé, e por isso, sua vida é cheia de vigor, estável, firme, e abundantemente abençoada (v.3).
Os v.4-5, aos quais nossos olhos se voltam nesse momento, apresentam os ímpios. Eles são bem diferentes da pessoa bem-aventurada.
Os ímpios
Como a Bíblia descreve os ímpios?
O ímpio é aquele que perturba a justiça na sociedade. Ele ameaça a integridade física e emocional das pessoas.
O ímpio levanta-se contra o justo e derrama sangue inocente (Sl 94.21; Hc 1.4). Ele age com injustiça e crueldade (Sl 71.4); ele é “o homem violento” (Sl 140.4); é soberbo (Sl 73.3; 94.2; 140.5) e atrevido (Is 13.11); ele é escarnecedor (Sl 1.1; Pv 9.7); é transgressor (Sl 34.38; a palavra “transgressor”, do hebraico pexa‘, procede de uma raiz que significa “revelar, revoltar”, ou seja o perverso é rebelde e se revolta contra Deus). O ímpio profere mentiras (Sl 58.3); ele age perfidamente, ou seja, uma de suas marcas principais é deslealdade e o engano (Hc 1.13). Ele nega a existência de Deus e do mundo espiritual (Sl 14.1); ele odeia ao Senhor (2Cr 19.2), não quer servi-Lo (Ml 3.18); não quer submeter-se ao senhorio de Deus (cf. Sl 2.1-3). Ele comete injustiça (Ec 3.16), violência contra os pobres e oprimidos (Is 58.4) e fraudes nos negócios (Mq 6.10-11).
Vale à pena também notar como o apóstolo Paulo apresenta os ímpios, em Romanos 1.18-31. Dentre as várias descrições dos perversos, o apóstolo afirma que “o próprio Deus os entregou a uma disposição mental reprovável, para praticarem coisas inconvenientes (v.28). Eles estão “cheios de toda injustiça, malícia, avareza e maldade; possuídos de inveja, homicídio, contenda, dolo e malignidade; sendo difamadores, caluniadores, aborrecidos de Deus, insolentes, soberbos, presunçosos, inventores de males, desobedientes aos pais, insensatos, pérfidos, sem afeição natural e sem misericórdia. Ora, conhecendo eles a sentença de Deus, de que são passíveis de morte os que tais coisas praticam, não somente as fazem, mas também aprovam os que assim procedem” (Rm 1.29-32).
Infelizmente nosso país é dominado pelos ímpios. Há muita gente roubando, violentando, matando, oprimindo, e cometendo todo tipo de atrocidades.
Infelizmente a corrupção é uma realidade em nosso pais. É difícil precisar o valor que anualmente é desviado pelos corruptos, mas estima-se que sejam centenas de bilhões de reais, variando entre 2% e 10% do PIB brasileiro”. Prejuízo causado: R$ 88,8 bilhões apenas na Petrobrás.[1] As cifras da corrupção (envolvendo propinas, fraudes em licitações, e lavagem de dinheiro) são astronômicas.
A impiedade também se manifesta de várias outras formas, além da corrupção. Os governantes estão mais preocupados com seus bolsos do que com a condição da saúde, da educação e do ensino do nosso país. Os presídios não são lugares em que os criminosos são recuperados da criminalidade, com vistas a serem reinseridos na sociedade, mas são verdadeiras escolas do crime. Facções criminosas dominam dos presídios. Há policiais corruptos.
Em meio a esse mundo em trevas, onde a impiedade reina, precisamos entender o que a Bíblia diz acerca do ímpio.
A instabilidade dos ímpios: v.4
O salmista apresenta uma comparação. Ele não compara os ímpios com uma árvore cujas folhas secam rapidamente. Antes, o poeta emprega outra figura, muito mais marcante: o ímpio é como a “palha”.
O “vento”, aqui, é o vento do juízo de Deus (Sl68.2). Pelo profeta Jeremias, Deus anunciou seu juízo, dizendo: “Espalharei vocês como a palha levada pelo vento do deserto” (Jr 13.24). Aqui no Salmo 1.4, lemos a figura do joeirar: um homem lançando o trigo debulhado ao vento; o vento leva embora a palha, mas o grão de trigo permanece na peneira. Desse modo, trigo e palha são separados (v.5).
Diferentemente da árvore plantada junto à corrente de águas (v.3), a palha não tem firmeza e estabilidade. Ela é facilmente conduzida pelo vento. A vida do ímpio é assim. É conduzida por qualquer vento. Qualquer modismo, qualquer ideia que seja atraente aos olhos humanos, qualquer vento de doutrina, enfim, qualquer coisa, por mais fútil e infundada que seja, é capaz de conduzir a vida do ímpio. Eis aqui um alerta, para todos nós: se nossas vidas não estão alicerçadas em Deus e em Sua Palavra, seremos conduzidos por qualquer coisa.
Aqueles que pautam suas vidas não na vontade de Deus, mas em seus próprios planos perversos e malignos, são conduzidos por qualquer coisa, e por fim, um dia serão conduzido pelo vento do juízo divino.
Os ímpios um dia serão dispersados. Portanto, não nos encantemos com a vida feliz que muitos deles aparentemente levam. Certamente essa é a crise de muitos piedosos: “Por que prospera o caminho dos perversos, e vivem em paz todos os que procedem perfidamente?” (Jr 12.1). Essa pergunta do profeta Jeremias tem sido entoada por muitos santos ao longo da história. O profeta Habacuque expressou sua crise na forma de oração: “Até quando, SENHOR, clamarei eu, e tu não me escutarás? Gritar-te-ei: Violência! E não salvarás?…Por esta causa, a lei se afrouxa, e a justiça nunca se manifesta, porque o perverso cerca o justo, a justiça é torcida.” (Hc 1.2,4).
No entanto, a vida do ímpio é uma ilusão. O ímpio e suas obras passarão. O seu plano mal ético e seu prazer são efêmeros. No dizer de Asafe, Deus coloca os ímpios em lugares escorregadios: Sl 73.18. Eles estão nos rochedos altos. Mas não perceberam ainda que o rochedo está molhado, e que no próximo passo eles escorregarão e grande será a queda deles. Asafe ainda compara a vida dos ímpios com um sonho: “São como um sonho que se vai quando a gente acorda; quando te levantares, Senhor, tu os farás desaparecer” (Sl 73.20 – NVI).
A vida do ímpio é como um sonho que logo passa.
Portanto, o que se destaca nesse v.4 é a instabilidade do ímpio (em contraste com a estabilidade da vida do bem-aventurado, apresentada no v.3). A sua vida é marcada pela falta de solidez e de firmeza.
O julgamento dos ímpios: v.5
O v.5 apresenta duas frases negativas:
Os ímpios não permanecerão no julgamento,
e (nem) os pecadores na congregação dos justos.
Na primeira frase do v.5, o “permanecer” traduz o hebraicoqum, “levantar”, “ficar de pé”, “erguer”. Por isso, a Bíblia de Jerusalém traduz: “Por isso os ímpios não ficarão de pé no Julgamento”. Afirma-se, assim, que no final, o justos permanecerão gloriosamente diante Deus, mas os ímpios não.
De fato, todo o Salmo 1 acentua as diferenças entre os ímpios e os justos. No v.1, o justo é alguém que não compactua com os valores e com estilo de vida dos ímpios. Há uma grande separação entre eles, pelo modo como eles vivem. Embora eles ainda convivem lado a lado, podendo em alguns momentos o ímpio prevalecer sobre o justo (Hc 1.4), no entanto, “no julgamento” de Javé, eles serão totalmente separados. “Mudou-se a direção da negação: no v. 1 era o honrado que evitava a sessão dos malvados, agora são os malvados que não têm acesso à assembleia dos justos. É tarde demais, não é hora de conversão, mas de receber a sentença.”[2]
Conforme se nota, a punição aos ímpios é o banimento à comunidade de Javé (cf. Sl 101.7-8). Isso, no fundo, significa o banimento à adoração ao único Deus. Os maus serão banidos para sempre da presença do Senhor.
Como alguém já disse, o inferno não é a presença do diabo, mas a ausência de Deus.
Conclusão e aplicações
Chegará o dia em que os ímpios serão dispersados pelo vento do juízo de Deus. Eles serão para sempre separados dos justos.
Mateus 13.47-40: “O Reino dos céus é ainda como uma rede que é lançada ao mar e apanha toda sorte de peixes. Quando está cheia, os pescadores a puxam para a praia. Então se assentam e juntam os peixes bons em cestos, mas jogam fora os ruins. Assim acontecerá no fim desta era. Os anjos virão, separarão os perversos dos justos e lançarão aqueles na fornalha ardente, onde haverá choro e ranger de dentes”.
Considerando tudo o que Bíblia ensina sobre os ímpios, qual deve ser a nossa postura em relação a eles? Precisamos ter as seguintes atitudes:
- Orar, para que Deus nos livre das mãos dos ímpios. Precisamos repetir a oração do salmista: “Livra-me, Deus meu, das mãos do ímpio, das garras do homem injusto e cruel” (Sl 71.4).
- Orar pelos governantes e por aqueles que administram a justiça em nosso país. No Salmo 82.4, apresenta-se uma das funções dos reis de Israel: “Julgue ele os aflitos do povo, salve os filhos dos necessitados e esmague ao opressor”.
- Orar para os ímpios, para que eles venham se converter ao Senhor. O profeta Isaías estendeu o seguinte convite para os ímpios: “Buscai o Senhor enquanto se pode achar, invocai-o enquanto está perto. Deixe o perverso o seu caminho, o iníquo, os seus pensamentos; converta-se ao Senhor, que se compadecerá dele, e volte-se para o nosso Deus, porque é rico em perdoar” (Is 57.7). Uma mulher sábia declarou: “Mas Deus não tira a vida; pelo contrário, cria meios para que o banido não permaneça afastado dele” (2Sm 14.14b – NVI). Será que não somos como Jonas? Este profeta, em seu fervor religioso, almejava o juízo divino sobre os impiedosos ninivitas. Quando eles se converteram, e receberam o perdão de Deus, Jonas ficou muito irado e desgostoso. A mentalidade de Jonas, que também está impregnada na cabeça de muitos evangélicos, dizia mais ou menos assim: “o que mais quero que é eles vão para o inferno”. Diferente da mentalidade de Jesus: “o que mais quero é que eles se arrependam, e se voltem para Deus”. Qual das duas mentalidades temos seguido?
- Orar para Deus traga seu juízo sobre esse mundo tenebroso, sem, contudo, alimentar ódio no coração, e sem se vingar daqueles que praticam maldades contra nossas vidas. Muitas pessoas tem sede de justiça. Diante de tantas impunidades, nossa sociedade clama por vingança. Queremos que o político corrupto seja preso, que o criminoso pague por suas criminalidades, que o assassino cumpra a devida penalidade, que o pedófilo receba a devida punição, que os violentos sejam combatidos e reprimidos. Enfim, queremos que a justiça seja feita. Isso é legítimo. Mas precisamos tomar muito cuidado para não alimentar o ódio. Não podemos dar lugar à vingança pessoal, mas precisamos orar para que o Estado cumpra sua função de combater as impiedades da sociedade (Rm 13.1-4), e também precisamos esperar que o próprio Senhor execute sua vingança contra os ímpios. “Não vos vingueis a vós mesmos, amados, mas dai lugar à ira; porque está escrito: A mim me pertence a vingança; eu é que retribuirei, diz o Senhor” (Rm 12.19).
Que a Igreja seja
luz em meio a esse mundo de trevas, até aquele Grande Dia, quando o Senhor,
reto Juiz, se manifestará em glória e trará a justiça eterna.
[1]https://guiadoestudante.abril.com.br/blog/atualidades-vestibular/9-casos-marcantes-de-corrupcao-no-mundo/. Acessado em 12.08.2019, às 15h:55.
[2]Luís Alonso SchökeL; Cecília Carniti, Salmos I, p. 123.