O DEUS DO IMPOSSÍVEL:Josué 10.1-15
Pr Luciano R. Peterlevitz, Igreja Batista Bela Vista, culto de oração em01.08.2019.
TEXTO: Josué 10.1-15.
Introdução
Conforme vimos, Josué 9 narra a aliança precipitada que Israel fez com Gibeão. A partir de então, os israelitas estavam obrigados a proteger os morados de Gibeão. Josué 10 narra o levante de cinco reis cananeus contra gibeonitas. Josué liderou suas tropas para ajudá-los. Naquela situação, Deus revelou seu poder extraordinário. Revelou-se como o Deus do impossível. Vejamos.
A mobilização dos inimigos: v.1-5
Os moradores de Gibeão “fizeram paz com os israelitas e estavam no meio deles” (v.1). A forma verbal “fazer a paz” (hebr. shalam) significa “estar em uma aliança de paz”. Conforme lemos em Josué 9, os gibeonitas, através de uma trapaça, conseguiram estabelecer uma aliança com Israel, e assim se livraram da destruição destinada aos morados de Canaã.
A partir de então, os gibeonitas se tornaram uma ameaça para as nações de Canaã. Adoni-Zedeque, rei de Jerusalém, montou uma coalizão contra Gibeão. O nome “Adoni-Zedeque” significa “o meu senhor é justo”. Estudiosos acreditam que o “senhor” desse rei era o Deus pagão Moloque, ou Baal. Na época de Josué, Jerusalém ainda não pertencia aos israelitas, mas estava sob o domínio dos “amorreus” (depois passou a ser controlada pelos “jebuseus”, para finalmente ser conquista por Davi).
Cinco reis foram convocados para lutar contra Gibeão: Hoão, rei de Hebrom, Pirã, rei de Jarmute, Jafia, rei de Laquis e Debir, rei de Eglom. “Com um mapa diante dos olhos, contemplamos a área abrangida por esta coligação de cinco reis. Compreendia, especialmente, toda a parte sul e oeste da Palestina, a mais populosa e mais fértil”.[1]
O rei de Jerusalém “temeu muito” (v.2.). Gibeão era uma grande cidade, mais poderosa de que Ai. O final do v.2 declara que os homens de Gibeão era “valentes” (hebr. giborim), termo que pode ser traduzido como “fortes” ou “corajosos” (o termo também ocorre no v.7). Eram homens preparados para a batalha. Ora, se os israelitas destruíram Ai, e fizeram uma aliança com os gibeonias, então isso significa que uma poderosa coalização estava montada, e as cidades cananeias se viam grandemente ameaças por isso. Então, Adoni-Zedeque mobilizou outros quatro reis para lutar contra Gibeão, a fim de quebrar a coalizão existente entre Gibeão e Israel, e desestabilizar assim o poder dos israelitas. Além disto, Gibeão ocupava uma posição estratégica em Canãa, pois era “…uma das principais passagens da região montanhosa para as planícies, desde Bete-Horom até o vale de Aijalom…”[2]. Portanto, era muito importante para Adoni-Zedeque destruir a força militar de Gibeão, pois isso recuperaria para as forças conjuntas de Canaã aquele importante centro administrativo.
Assim, os inimigos amorreus se levantaram para pelejar contra os moradores de Gibeão, que estavam no meio do povo de Deus. Aqueles que se aliam com o povo de Deus inevitavelmente precisam enfrentar a fúria dos inimigos do povo de Deus. Quando uma pessoa não-convertida começa a se alinhar ao povo de Deus, o inimigo se mobiliza para destruir essa pessoa e levá-la para longe dos caminhos do Senhor.
Gibeão pede socorro a Josué: v.6
Os homens de Gibeão pediram ajuda a Josué. “Não retires as tuas mãos de teus servos”. Foi a “mão” de Josué que destruiu Ai (Js 8.26), na verdade, o Senhor entregou aquela cidade nas mãos de Josué (Js 8.18). Assim, a “mão” denota poder militar.
Os homens de Gibeão clamaram: “sobe apressadamente a nós, livra-nos e ajuda-nos”. Esse pedido estava baseado na aliança que Israel estabeleceu com Gibeão. A aliança pressupõe a promessa de libertação. É isso que Deus fez com o povo de Israel: fez com ele uma aliança (hebr. berit), o que significa que Israel seria protegido de todos os inimigos (Sl 105.8-14; cf. 2Sm 7.8-11). Conforme um estudioso do Antigo Testamento, o clamor dos gibeonitas para Josué relembra “os salmos de lamentação, em que o salmista é ameaçado pelo inimigo ao redor e clama ao Deus da aliança estabelecida com o salmista para que lhe dê salvação”.[3] Como Deus socorria Israel por causa da sua aliança, assim também os israelitas deveriam socorrer os morados de Gibeão por causa do compromisso da aliança firmada entre eles. Israelitas e gibeonitas formavam uma comunidade de aliança.
A igreja também é a comunidade da aliança. É o povo que foi socorrido pelo Senhor. E o povo socorrido é o povo que socorre. A Igreja é o Corpo de Cristo, formado por vários membros. Esses membros estão unidos pelo sangue de Cristo, o sangue da nova aliança. Há uma aliança de compromisso entre nós. Como irmãos e irmãs, comprados pelo sangue de Jesus, precisamos socorrer uns aos outros. Que possamos nos dispor, para ajudar aqueles irmãos e irmãos que nesse momento estão enfrentando o ataque do inimigo, seja orando por eles, ou os consolando com palavras de esperança, ou ainda provendo para eles recursos materiais de acordo com nossas possiblidades.
Encorajamento: v.7-8
Josué se dispôs a socorrer os gibeonitas (v.7) e foi encorajado por Javé (v.8).
Josué poderia ter pensado: “insensatamente fiz uma aliança com Gibeão, e agora, será que Javé nos dará vitória contra esses cinco reis?”. Então Javé veio ao encontro de Josué, e prometeu que todos aqueles reis seriam entregues nas mãos dos israelitas (v.8). De fato, Israel, ao fazer uma aliança com Gibeão, agiu de forma insensata e desobedeceu à ordem divina de destruir todos os morados de Canaã. Entretanto, Deus fez com que aquela aliança precipitada com gibeonitas fosse utilizada para que seus propósitos soberanos fossem cumpridos. Nicodemus Lopes explica: “Foi um erro de Israel, sim, mas foi graças a esse erro que os reis cananeus ficaram revoltados e provocaram a guerra no centro-sul da terra. Deus acabou transformando o erro que havia sido a aliança em um motivo para que ele ganhasse a guerra contra os amorreus, tomando toda a região central da terra”.[4]
Aprendemos aqui uma lição. Deus, em sua infinita graça, pode utilizar até mesmo nossos erros para que seus propósitos se cumpram. Isso não significa que estamos autorizados a errar, pois nossos erros ofendem a glória de Deus e podemos pagar um alto preço por eles. Mas, de forma sábia e bondosa, Deus pode reverter o mal em bem, quando, após o erro, nos voltados com nosso coração contrito para o Senhor e suplicamos pelo seu perdão.
“Os erros que cometemos podem nos envergonhar,especialmente quando decorremde precipitação e de falta de consulta aoSenhor. No entanto, devemos nos lembrarde que, para o cristão consagrado, nenhumerro é definitivo. Deus pode usar até nossosequívocos para cumprir seus propósitos. Alguémdefiniu o sucesso como ‘a arte decometer erros quando ninguém está olhando’,mas uma definição mais apropriadaseria ‘a arte de ver a vitória onde outrosvêem apenas derrota’.”[5]
O Senhor socorre poderosamente Israel: v.9-15
O próprio Senhor entrou na batalha (v.10), e, do céu, lançou sobre os exércitos dos amorreus grandes pedras (v.11). Deus fez os inimigo fugirem diante de Israel. O céu desabou sobre aqueles amorreus. E os moradores de Gibeão foram protegidos, porque estavam do lado certo, estavam de lado do Deus de Israel. É muito melhor enfrentar a fúria dos homens do que a fúria de Deus. As grandes pedras não desabaram contra os gibeonitas, mas contra os cinco reis amorreus porque eles estavam desafiando o povo de Deus. Quando estamos do lado errado, o céu desaba sobre nós. Mas quando estamos do lado certo, o céu luta a nosso favor.
Diante da batalha feroz, “Josué falou ao Senhor” (v.12). Josué falou com a Pessoa certa!
Os v.12-14 relatam o dia em que a terra parou. Um milagre extraordinário. Josué precisava de mais tempo para vencer os inimigos. Se escurecesse, os inimigos poderiam fugir, e depois poderiam unir forças novamente para lutar contra Israel. A vitória precisava ocorrer naquele dia. Então Josué pediu para o sol se deter, e para a lua parar. Um pedido ousado, não acha? De fato, ousadia e fé andam juntas.
O início do v.13 declara que “o sol se deteve”. O verbo hebraico utilizado aqui, damam, que literalmente significa “estar em silêncio, estar calmo”, tem sido interpretado de várias maneiras, e assim, existem várias formas de interpretar o fenômeno relatado em Josué 10.12-13:
- Alguns estudiosos acreditam que esse verbo indica um eclipse solar. O sol ficou em silêncio, ou seja, escureceu-se. De acordo com essa perspectiva, a escuridão dificultaria a ação do inimigo, e facilitaria a vitória de Israel. Apoiando essa interpretação, poder-se-ia ainda mencionar que a “lua parou” (verbo utilizado aqui é ‘amad, “permanecer, estar parado”), dando a entender que a luta ocorreu sob o luar da noite.
- Outros estudiosos acreditam que o verbo hebraico damam subtende uma diminuição do calor do sol, para que os israelitas tivessem um clima mais favorável para a batalha.
- Ainda outra interpretação sugere que, na verdade, o sol não “parou”. O que teria ocorrido, de fato, seria uma refração especial dos raios solares, ou seja, a luz solar continuou sobre a terra mesmo após o pôr do sol.
Todas essas interpretação enfrentam um sério problema, quando lemos a segunda metade do v.13. Aquele dia em que o sol “parou” foi tão espetacular, que sua memória foi registara no “Livro dos Justos”. Esta desconhecida obra literária apresenta duas afirmações: 1) “o sol parou (hebr. ‘amad, “permanecer”) no meio do céu”; e 2) “não se apressou a pôr-se, quase um dia inteiro” (no começo da frase, o hebraico literalmente diz que o sol “não teve pressa para ir embora”). Ou seja, o sol parou. A expressão “quase um dia inteiro” sugere que naquele dia o sol brilhou por quase doze horas a mais.
O sol parou? Cientificamente, sabemos que não é Sol que gira em torno da Terra, mas sim, a Terra que gira em torno do Sol. Mas precisamos compreender que a Bíblia não apresenta uma linguagem científica. A linguagem da Bíblia é coloquial, popular. É uma linguagem descritiva, ou seja, descreve os fenômenos físicos com a perspectiva de como o autor os enxerga. Até hoje falamos do “pôr do Sol” ou do “nascer do Sol”, e mesmo os cientistas reconhecem que essa linguagem popular não é errada.
Muitos perguntam, ceticamente: “mas se a terra parasse, o Universo se tornaria um caos, pois os planetas iriam se colidir!”. Sim, é isso mesmo. Na verdade, não foi só o movimento da Terra em torno do seu eixou que parou. Todo o Universo parou. Isso porque um homem clamou!
Nada é impossível ao Deus que criou os céus e a terra. Podemos nos unir em oração ao profeta Jeremias: “Ah! Soberano Senhor, tu fizeste os céus e a terra pelo teu grande poder e por teu braço estendido. Nada é difícil demais para ti.” (Jeremias Jr 32.17; veja também o v.27). Deus pode fazer infinitamente além do que pedimos ou pensamos. O poder de Deus é ilimitado. Ele tem poder para fazer todo o Universo parar, quando o povo de Deus clama para Ele.
O dia que o “sol parou” foi único (v.14). Conforme declara o v.14, foi o dia em que Deus atendeu “à voz de um homem”. O final do verso explica que o Universo parou naquele dia “porque o Senhor lutava por Israel”. Quer dizer, Deus estava cumprindo o seu propósito de conceder a terra de Canaã para Israel, conforme havia sido prometido aos antigos patriarcas no livro de Gênesis.
Conclusão
De acordo com narrativa de Josué 10.1-15, Deus agiu poderosamente para livrar Gibeão das mãos de cinco reis amorreus e para conceder vitória a Israel. O clamor dos gibeonitas por socorro foi atendido. A oração de Josué, clamando por doze horas a mais naquele dia, foi ouvida.
Nos dias de hoje, vários inimigos se levantam contra o povo
de Deus: perseguições, enfermidades, crise financeira, incertezas quanto ao
futuro político e econômico do nosso país, etc. “Pedimos e oramos: que Deus nos
mostre, nos convença e nos persuada e de que ele está no controle. Deus está no
controle! Pode parecer às vezes que não há governo ou controle na situação do
Brasil,mas sabemos que há um Deus no controle da nação e do mundo inteiro, e
ele faz todas as coisas cooperarem para o bem do seu povo”.[6]
Muitas vezes, olhamos para a situação caótica do nosso país, e dizemos: “tudo
está perdido”. Olhamos para muitas situações difíceis e ameaçadoras que nos
cercam, e dizemos: “é impossível que isso seja revertido”. Mas precisamos
sempre nos lembrar: “Porque para Deus não haverá impossíveis em todas as suas
promessas” (Lucas 1.37). Louvado seja o Deus do impossível!
[1] MESQUITA, Antônio Neves. Estudo nos livros de Josué, Juízes e Rute. Rio de Janeiro: Casa Publicadora Batista, 1973, p. 80.
[2] WALTON, John; Matthews, Victor; CHAVALAS, Mark. Comentário Bíblico Atos: Antigo Testamento. Belo Horizonte: Editora Atos, 2003, p. 230.
[3] HESS, Richard. Josué, p. 170.
[4] LOPES, Augusto Nicodemus, A conquista da terra prometida, p. 200.
[5]Wiersbe, Warren W. Comentário Bíblico Expositivo. Vol. 2, p. 60.
[6]LOPES, Augusto Nicodemus, A conquista da terra prometida, p. 202.